Fotoletras Poéticas

Escrever, fotografar: eis a poesia do sentir; eis a poesia do olhar! Fotografar o que se vê, escrever o que se sente!
Eis-me aqui...

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Dulcinéia

Dulcineia

Quem tu és não importa, nem conheces
O sonho em que nasceu a tua face:
Cristal vazio e mudo.
Do sangue de Quixote te alimentas,
Da alma que nele morre é que recebes
A força de seres tudo.

              José Saramago

Um comentário:

  1. PASSEIO EXISTENCIAL




    No fundo do amor está o amor.
    À volta, no cimo, estão diversas coisas
    Que às vezes nos entretêm: os nomes,
    Principalmente, os nomes!
    Somos todos iniciados na técnica de compreender
    Que Outono é quando as folhas caem!


    Podíamos passar por entre elas...
    Ser-lhes a invocação imediata...
    Enfim! Sermos díspares parcelas
    Desse jogo infinito, a concordata...
    ...Um tratado! Caminhamos..., elas caem,
    O sol vem recortante, capilar,
    E os olhos descem e cerram, descem
    Para dentro em busca do seu começar!

    As pombas rodam, rodam as árvores,
    Codificam-se os gestos e as cores
    E faz imenso vento ruissussurrante
    Mexendo as vestes, os cabelos
    Os endereços, os remetentes, os selos
    A imagética do corpo tonificante
    E o chiar dos pneus, o tilintar eléctrico
    A voz anunciante, o nome métrico.
    Se nos liquidamos as pombas saem
    Do quadro – é melhor deixá-las ficar
    Como se fossem paz à volta do amor
    Coisas, nomes principalmente, a rodar
    A voar!...


    Estamos num jardim: um qualquer!
    Faz menção de sermos homem e mulher
    ( É que podíamos!... Deveras! ) Ou avenida!
    Porque não sonhos?... O sonho também!
    Um saco deles! Bagagem de mistério...
    Um livro... Um quarto de aluguer...
    Pessoas amorfas que vão e que vêm
    E que arrastam consigo toda a vida,
    E um odor a incesto e adultério...


    E os olhos cerram, descem, descem...

    E os olhos cerram, descem, descem...


    Deixámos os lábios que sabem a amizade:
    Deixámos as roupas que usam o desejo:
    Deixámos o sangue que cozinha prazer:
    Deixámos as mãos que esculpem carinho:
    Deixámos a palavra que recita a verdade:
    Deixámos a despedida que encontra o beijo:
    Deixámos o sol que encanta o crescer:
    Deixámos o vento que murmura caminho:
    Mas os olhos cerram, descem, descem...

    Mas os olhos cerram, descem, descem...

    Mas os olhos cerram, descem, descem...


    Há, então, um pestanejar: o sonho agita-se.
    E os olhos cerrados, descidos, perguntam:
    « Para onde vais? » - somos feitos assim!
    E cada um pensa e contrai-se.
    Fecha-se. Circula. E as respostas ecoam:
    « À procura de mim » « À procura de mim »
    « À procura de mim » « À procura de mim »
    « À procura de mim » « À procura de mim »

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