Fotoletras Poéticas

Escrever, fotografar: eis a poesia do sentir; eis a poesia do olhar! Fotografar o que se vê, escrever o que se sente!
Eis-me aqui...

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Olhar Desviado

Karina Araújo Campos
Férias, Belo Horizonte, 18/07/1991.

O dia amanheceu
e eu com meu puro coraçãozinho
pensava no Senhor!

Levantei-me e fui à cozinha.
Vi a vela acesa e olhando-a estarrecida
fiquei pensando na vida...

Desviei meu olhar e disse em pensamento:
- Não mereço ver tão grande símbolo e luz
do Mestre.

- Olhando a janela,
a chama continuou a refletir nos meus olhos,
e pensei: - Se a luz reflete em mim,
é sinal de que Deus nunca terá fim.

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domingo, 26 de julho de 2009

Os meus trinta


Karina Araújo Campos
12 de junho de 2009.

Cedo ou tarde vamos descobrir que quem importa para nós somos nós mesmos. E não se trata de imaturidade ou egoísmo não, nem de um retorno literal ao “id”, mas sim, de que se você transita durante alguns bons anos sobre a tentativa de realizar-se no outro, ou de que outrem o realize e baste para você é cansativo, e cansar-se é, na maioria das vezes desgastante e traz infelicidade.

Incrível que no ato de tais descobertas na vida, há sempre uma revolução. E revolução, já sabe... algo na essência do ser se modifica, quebra paradigmas, destrói-se soldados internos, nascem monges, ou destrói-se monges e nascem-se soldados dentro de cada um.

Pelo menos ao longo das minhas primaveras aconteceu assim. Como em meu conto “Guerra Íntima”, essa guerra que nunca cessa. O importante é entender as transformações.
Às vezes se recolher, ou extravasar.

Hoje eu não vou ouvir o que me desagrade e permanecer calada. E a maior de todas as descobertas é que não estou só falando. Estou agindo. Agindo bem ou mal, estou falando. Claro, devo atentar-me para o modo da reação ou ação, mas não profano mentiras, mas o modo da agir ou reagir, devo repensar. Estou na fase “id”, na impulsividade do transformar.

Que assim seja! Atire a primeira pedra quem tem domínio e controle total sobre si mesmo.

Meu desafio hoje é fazer e ser apenas o que quero. Ser o que sou. E ter também. Por que não?

Lutas constantes fazem parte do meu cotidiano, do cotidiano de todos nós. Nada nos impede de ter conquistas materiais à partir do trabalho. Trata-se de buscas e retornos. O que virá, o que será? Não importa. Vamos buscar. Buscar na independência. Desgasta-me a idéia de que tenho que depender de outrem para viver, para fazer, para realizar. Não acredito nisso. Se quero vou fazer, vou buscar. Livrai-me Deus, de um dia ser uma cruz ou um empecilho para alguém.

Deixai, Deus, os jovens virem com toda força e os velhos se irem com suas inevitáveis fraquezas. Mas tornai-nos, Universo, independentes de alma. O querer depender é lastimável. Lastimável... Por isso, eu vou...

Aquela frase que diz “não fazemos nada sozinhos” não existe para mim. Eu faço sim. Muita gente faz, e é feliz, ou infeliz, ou tem retornos, ou não. Assim como todo mundo. E também não significa que tais atitudes signifiquem egoísmo, egocentrismo. Simplesmente que fazemos sim, coisas sozinhos. Alguém vive no lugar de alguém? Alguém passa para alguém o que a pessoa tem que passar? Alguém morre na hora errada ou no lugar de outra pessoa? Nem tentem... Vai dar errado. Basta a sua própria cruz. Ajudar e ser solidário não é isso. Nem tampouco sua solidariedade é a correta ou significa solidariedade para o outro. E o que você quer? E o que o outro quer? Na complexidade do significado real de tudo isso, creio que passei a mensagem que queria.

Chegar aos trinta anos é como ser adolescente. Você está velho demais para algumas coisas, então você é imaturo. Ou você é novo demais para outras coisas. Concluindo, a imaturidade é a constante da vida do sujeito. Assim como na adolescência, a falta de entendimento para essa máxima ainda permanece. Mas, continuamos a vida, que é linda, e basta estarmos vivos para viver. E a vida é aprendizado mesmo. Ruim é gente que acha que sabe tudo e que já viveu tudo e não tem nada para aprender. Aja...

É estranho o dia do aniversário. E vamos acostumando com tanta estranheza com o passar dos anos. Aquele frio na barriga que temos quando criança não acontece mais. O dia parece que é domingo, mesmo que seja dia de semana. Fica tudo meio deslocado. E o aniversariante mais deslocado ainda.

Este ano eu escolhi fazer o que meu coração pedia há aproximadamente uns três anos. Viajar. E ter consciência de que o aniversário é meu. E que não tenho que fazer aniversário para os outros.

Cada um faz o que quer no seu, e não tenho que comemorar porque os outros querem. Portanto, uma dica: pensem nos próximos aniversários de forma organizada. Pensamento organizado e consciente do que realmente querem.

Já que tudo na data do nosso nascimento é deslocado, parece que por causa do próprio nascimento mesmo. Nós saímos do ventre da nossa mãe para um mundo deslocado de tudo, e aí tudo retorna à memória nesta data. Bom, eu preferi me deslocar para outro lugar no meu dia. A idéia é que tudo fosse uma espécie de retiro e foi. No Caraça, parque de reserva natural, conheci mais que um novo lugar. Conheci um pouco mais de mim. Desloquei-me o tempo todo. Entre trilhas e natureza, entre histórias e histórias, as que foram ditas e as que não foram contadas, mas que permanecem no ar. Na alma daquele lugar. Nas caminhadas pensamentos mil vão e voltam. Quem sou? Quem fica para trás? Quem chega? Quem se instala? Um eu, eu, eueueueueueueueueueueueueueueueue...

Na visita ao museu encontro as mais belas fotos dos animais e espécies existentes no local; dentre elas as borboletas. A borboleta que traduz lindamente e levemente a transformação. E o presente maior foi ler o poema denominado “A terapia das borboletas”, cujo autor Luiz Augusto Cassas escreveu de forma sublime, o que me ajudou a “desencasular-me”. Essa é mesmo a terapia da vida: a transformação / a mudança de atitude / a ação transformada a todo momento, a todo instante / novas formas a um ser, a um agir, a um estar, a um querer / SER. E amanhã, outro SER. Em transformação sempre.

Um eu em transformação constante, com experiências já vividas. O externo se torna cada vez menos importante, o coração, o querer, o desejo, o realizar-se, o interior fica cada vez mais importante.

O seu olhar diz mais que suas palavras para quem o compreende. E quando a atitude o leva a sussurrar suas escolhas, elas se tornam ouvidas universalmente, causando medo e receio alheios. O sussurro é o grito da alma. E a sua escolha é divina, seja ela qual for. Será respeitada. Descobrir que as escolhas provindas de causas e conseqüências é responsabilidade de cada um, fruto em potencial de si próprio, e é mais que explicativa para saber que agimos sozinhos sim, o que se passa dentro de nós é uníssono com nosso âmago e nada mais. Depender de quem para agir? Desloquemo-nos sempre. Feliz 30 anos quantas vezes for preciso para todos nós.

CAMPOS, Karina Araújo. Belo Horizonte, 12 de junho de 2009.

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quarta-feira, 22 de julho de 2009

Cálice do Amor

Karina Campos
Maio de 2004.

Naquela taça restou apenas
O último gole de vinho
Embebido da saliva tua.

A marca da tua boca
Molhada na borda.

O calor das tuas mãos
Cheirosas, envolventes.

O reflexo da vela acesa
Que derretia a vislumbrar
O amor que enaltecia o brindar
Supremo de dois corações que se
Reconheciam em juras de amor eterno!

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segunda-feira, 20 de julho de 2009

Feto


Karina Campos


Como no ventre de uma açucena
cercada por auréola atenuante,
acerca de sublime sentimento,
dorme pequenino ser
que diante dos fatos da vida,
acalenta, mesmo que em sonho
o esperado movimentar das asas de uma borboleta.
Primeiros gestos a despertar na aurora,
raios vívidos da criação
num esboço supremo de vida
a aflorar em campos terrenos, o primogênito
que espera em alma doce e sutil
o limiar de um vôo alçar,
abençoado por céu, terra e mar.

Abril de 2004.

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Flor

Karina Araújo Campos
29 de junho de 2009.

Chama-me “Flor”,
Num grito carinhoso de necessidade.
Minha pele em você despetala-se,
Suave perfume do querer.

Ô Flor...
Cheiro de jasmim exala no ar.
Fareja minha essência em doce beijo
As cores desaparecem
Tornam-se transparentes...

Como um véu sem cor,
Duas almas que transformam
a Flor em Amor...

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Pa-ciente

Karina Araújo Campos

Você pergunta:
_ Por que você está aqui no Galba?
- Tenho esquizofrenia. É isso...
Eu me pergunto:
- Há alguém mais consciente de si aqui?
...
Os meus ouvidos são apenas escuta,
De palavra sãs, de frases insanas,
De delírios divinos, de delírios profanos,
De cabeças alucinadas...

Eu escuto,
Sua subjetividade humana
Portadora da deusa da loucura!

Dedico aos esquizofrênicos, cujas entrevistas me tornaram mais Humana!


“A loucura é jovem, muito jovem...
Mesmo sendo estudante de Psicologia percebi um certo temor, um certo não, um grande temor dos estudantes em se tratar com essa jovem: a loucura.
O medo do desconhecido, o medo da subjetividade louca, o medo de cada reação humana psicótica, ou de cada psicose com suas características diagnósticas... Estamos lidando acima de tudo com a subjetividade humana. O preconceito é muito grande. Acredito que, além do conhecimento técnico é preciso muito mais para ser um profissional na área da saúde mental. É preciso afeto na profissão. A afeição profissional, aquela que dá ao profissional motivação suficiente para lidar com as doenças mentais e saber das suas particularidades e diferenças, das semelhanças e da singularidade de cada psicótico, de cada transtorno, de cada patologia, de cada sorriso, de cada lágrima. São seres humanos, acima de tudo. A patologia é apenas um detalhe. E este detalhe é a grande diferença na sociedade.”

Karina Araújo Campos
Nota: 2008 - Estudante de Psicologia – Percepção diante das aulas de observação no Hospital Galba Veloso


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domingo, 19 de julho de 2009

Totem


Karina Campos

Obs.: Totem econtra-se na Antologia Mulheres Emergentes, em comemoração aos 18 anos do ME, coordenado e organizado por Tânia Diniz. Essa página foi uma presente da minha sogra, a escritora Clevane Pessoa, devido ao tema MULHER!

Eu vislumbro um totem em mim,
que cresce hierarquicamente desde minha infância.
Mas eu não sou exclusivamente em cada momento um animal,
uma essência, uma virtude.
Eu sou a soma das virtudes e a mistura dos bichos.
Me vejo mulher.
Minha cabeça é o comando de tudo.
Meu cérebro humano ao topo está vinculado
à luz suprema do cosmo, da divindade.
Uma coroa dourada está ligada através de raios viajantes,
dourados, envolvidos por pó de ouro transcendente.
A inteligência, a consciência e a espiritualidade são minhas virtudes mentais.
Abaixo da minha cabeça, uma cabeça de leão com a boca aberta.
Seu rugido ainda pode ser ouvido pelos sons do universo.
É o grito, é a fala, é o som... Sua virtude é a ponderação.
Eu falo. Eu calo.
Nas laterais ursos, panteras, tigres, cavalos, búfalos...
Animais que carregam e sustentam o viver.
Sua virtude é a força, a coragem.
Erguem o tóten na postura esguia;
empina-se para os desafios da vida.
Ao centro a águia.
Asas abertas. Borboletas e pássaros multicores.
Movimento. Transmutação. Sua virtude é o amor.
O amor move tudo. O amor move o universo.
Tudo se move através do amor. O amor a tudo modifica.
Um pouco abaixo vejo gatos. Sua essência é a captação.
Sua virtude o entendimento, a transformação.
O Chacra Básico é mantido por coelhos, golfinhos.
Sua virtude: a maturidade, a produtividade, a reprodução.
Troncos gigantes sustentam e embasam esse reino de poder.
Virtude: sabedoria, coragem, amor, dignidade, simplicidade.
A mãe natureza fortalece o SER.
Ao fundo, as asas da liberdade envoltas pelo verde
esperança a bailar no Universo.
Liberdade movida pelo desejo, pela evolução, pela criação.
E um sorriso de mulher ecoa no Universo.

Todos os direitos reservados ao autor. Autorizada cópia, desde que divulgada autoria.

O primeiro sapato

Karina Campos
Belo Horizonte / MG, 05 de abril de 2007.

Obs.: Esse conto foi Destaque literário no Concurso Letras Premiadas Alpas XXI – Edição 2007.

Estrelas no céu. Milhões de estrelas no céu.
Já passara a metade da noite e a estrada estava deserta. Estrada estreita, terra fofa, o clima ameno. Ainda não serenara. Uma poeira de luzes pisca no ar qual lanternas a alumiar a noite. Belos vaga-lumes, estrelas cintilantes, habitantes da Terra.

A sinfonia dos grilos, das cigarras, dos sapos ecoa da mata nos arredores desta estrada. Gigantescas árvores abrem frestas para que a lua e as estrelas sejam bússola aos andarilhos.

Um uivo rasga a noite e cala a orquestra dos bichos.
Ele não se assusta. Continua sua caminhada na calmaria dos anciãos.
Pés descalços, rachados, acostumados às erosões, calos duros, guiados pela experiência, levados pela rotina daquela estrada. Bela estrada!

Para onde o levaria?

Calças arregaçadas, esgarçadas, cerzidas, mas limpas. Camisa desbotada em tom de palha, quarada pelo sol.

Rosto calmo, franzido pelas rugas da idade, pelos anos de luta, de busca. Um cachimbo no canto da boca, com um jeito único de fumar: ele o mascava.

Devagar, pé ante pé, uma de suas mãos segurava o cachimbo, a outra o cajado.

Aos setenta e dois anos, o Senhor Galadriel percorria este caminho. Voltava da fazenda do “Grande Senhor” para seu casebre.

Andava freqüentando a escola para aprender a assinar o nome. Não queria mais registrar o polegar. Achava importante aprender a escrever o próprio nome. Embora quase o esquecesse diante de ser tratado sempre por “Seu Driel”.

Representou por toda sua vida o significado de seu nome: ser bom diante de Deus. Não bastasse, seu sobrenome era “dos Santos”.
Freqüentava a Igreja Nossa Senhora das Dores no lugarejo de Pedra Negra, aos domingos e dias santos.

Seu Driel ia e vinha naquela estrada por tantos anos. Por tantos anos sempre descalço.

Calçou no dia do seu casamento com a falecida Zinha um par de chinelos de borracha amarelos e no paletó branco que foi de seu avô usou um cravo colhido do quintal. Seu sorriso iluminado ainda tinha a dentição. Hoje lhe restam poucos dentes, mas o sorriso da boca que masca o cachimbo ainda é iluminado.

Seu Driel caminha. Anda guiado pelos pés descalços. Os pés que conhecem cada pedra, cada cascalho, cada grão de areia daquela estrada.

Zinha, que foi seu primeiro e único amor engravidou pouco depois de se casarem. Em seu humilde lar explodiam de alegria.

Seu Driel pegava a estrada cantarolando, venerando a chegada do filho. Sempre vaqueiro, cuidava dos bichos como cuidava de Zinha. Cheio de zelo, amor, carinho...

O curral era seu lar durante o dia. À noite, os braços de Zinha.

Os meses se passaram e numa noite Seu Driel foi chamado pelo capataz da fazenda às pressas. Era Zulmira, a vaca holandesa que dava cria. Emprenhou precocemente do garrote Zeus. E lá se foi Galadriel, andando a passos gigantes, pés apressados para ajudar Zulmira a parir o bezerro. No chão a coitadinha não agüentava mais de dor e acalmou-se ao ver seu zeloso cuidador.

Sofreu. Sofreram. Os três. Sofreram muito.
A vaca Zulmira, Seu Driel e Zinha.

Enquanto Seu Driel ajudava Zulmira, Zinha desfalecia-se em dores do parto. Só. Gritava e gemia a vinda dos bebês. Eram gêmeos. Nas redondezas só os bichos a ouviam. Gente mesmo não estava a menos de um quilômetro dos diâmetros de sua casa.

Deitada, agarrava com as unhas os lençóis úmidos de sangue, suor e nada da chegada de Driel.

Urrava como onça presa em caverna.
Fez muita força e, enfim, nasceu o primeiro dos bebês.
Zinha olhou naquele rostinho que lhe sorriu como primeiro ato terreno.

Branca, pálida, sem forças, suspirou e caiu para trás. Não voltou mais à vida. Nem com a chegada do marido algumas horas depois.

Seu Driel desesperou-se, desesperançou-se.
Viu seu filho nas entranhas da mãe, ambos imóveis.
Chorou de tristeza. Chorou de alegria.
Tomou todas as providências para o velório de Zinha e seu segundo filho, que ia no ventre da mãe.

No filho vivo pôs o nome de Samuel, o mesmo nome do bezerro de Zulmira e Zeus.

O dono da fazenda mandou entregar a Galadriel uma caixa no dia seguinte.
Envolta de laço azul, Seu Driel desfez calmamente cada volta da fita. Abriu a tampa, apalpou todo o papel de seda. Desembrulhou o presente. Era um belo par de sapatos italianos, bico quadrado, preto, envernizado.

No fundo da caixa um bilhete escrito com letra firme:

- Caro Galadriel,

Envio os sapatos para que te sintas bem.
Nada melhor que um par de sapatos quando perdemos o chão.
Embase-se neles.
Condolências,

Francisco Nonato.

Aos vinte e sete anos Galadriel recebera os primeiros sapatos de sua vida. Usou-os no velório e no enterro. Chegou em casa, limpou-os, lustrou-os e guardou-os novamente.

Os anos foram passando. Seu filho Samuel crescia. O bezerro também. Antes que Samuel se tornasse um rapaz, o bezerro Samuel tornou-se garrote.

Sempre amigos. Samuel, o pai e o garrote.

Ainda hoje, Seu Driel abre a caixa de sapatos somente para cuidá-los. Não mais o calçou.
Aos setenta e dois anos embasa-se na sola dos próprios pés. Não mais calçou sapatos. Anda com pés no chão. Calçado de sua própria segurança. Do coração que pulsa em seus pés.

Seu caminho, sua estrada sempre o levam para casa.

Mas no caminho, além das vozes dos bichos, ouve-se também o sorriso de Zinha.
Um sorriso que as estrelas, o céu, as árvores respondem nos balançar dos ventos, na voz da noite.

E ele caminha, deixando suas pegadas na terra fofa, ecoando sorrisos que enlaçam os sorrisos de Zinha.


Todos os direitos reservados ao autor. Autorizada cópia, desde que divulgada/preservada a autoria.

sábado, 18 de julho de 2009

A terapia das borboletas


Eu amo as borboletas!

Recebi no meu aniversário deste ano (2009),

um encontro com o poema da foto,

que fica no Museu do Santuário do Caraça.

Foi mais que um presente: era o que eu queria ouvir!


Violetas


Karina Araújo Campos
Belo Horizonte, Praça Tirandentes, 30/06/2009

Contemplação...
Inspiração...
Exemplo...

Em pequeninos vasos
desabrocha sublime a
raridade de sua beleza.

O espetáculo multicor
de misturas infinitas
vive, sobrevive, manifesta:
Emoção, humildade, amor!

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A perfeição da paz


Karina Araújo Campos
BH, 24/04/2004.

Obs.: Esse poema participou do Projeto "Paz e Poesia" (2008), coordenado pelo Poeta Marco Llobus, Poetisa Clevane Pessoa e com a participação de maravilhosos poetas e artistas mineiros.


No horizonte azul,

Onde o encanto das águas beija o céu

Infinitas gotas de cristal

Evaporam-se na imensidão.

Minhas pegadas vão deixando marcas

Na fina areia.

Casquinhas de conchas cobrem meus dedos, meus pés

A fugir do mar.

Acima, uma colônia sobrevoa,

Portadora de toda a minha história de vida.

Está a cuidar de tudo:

Do céu, do mar, da areia, de mim.

De todo o meu passado, presente e futuro.

Raios de sol dourados queimam minha pele,

Iluminam minha vida.

Num momento de reflexão divina.

Uma junção perfeita!

Eu e minha paz interior!

Todos os direitos reservados ao autor. Autorizada cópia, desde que divulgada/preservada a autoria.

MPB: já nasceu eterna.

Karina Araújo Campos
Belo Horizonte, 04 de janeiro de 2008.

Obs.: MPB: Já nasceu eterna é Menção Honrosa pela Editora Guemanisse, no Prêmio Cantigários, em 2008.

Nos convés dos navios vindos para o Brasil chegava também um batuque negro, característico africano, que ajudava o gingado do navio, a percorrer com balanço o mar. Juntou-se ao fado melancólico, amoroso, saudosista e a outros ritmos de outras tribos e povos que vinham formar o Brasil. Que vinham formar a MPB.

Cantigas populares, num caldeirão fervendo com o toque dos tambores dos negros, gritavam pedindo Chuva numa dança sagrada, ao ensejo de Tupã e Jaci. A natureza chacoalhava com os chocalhos xamãnicos, o céu esbravejava com os pecados dos pecadores do Brasil. Os sons religiosos misturados às cítaras dos anjos tentaram domesticar o zumbir da percussão natural do sangue que aqui habitava e habita.

Não adiantou o ralhar dos trovões. Ela vinha surgindo, e foi crescendo, qual uma menina-moça sensual, maliciosa, gostosa, desnuda, no canto, serena, requebrando as cadeiras, enfeitiçando o sangue, enfeitiçando a carne, morena, beiçuda, de olhos grandes... Sente o som da cuíca, aumenta o som dos tamborins, olha o chocalho, o chorinho brasileiro, minha nossa!

Música Popular Brasileira, Música para Pular no Brasil, Música do Povo no Brasil, Povo de um Brasil Musical, Brasil Musicado e Popular, Brasileiro Popular Musicista.

E abram as alas que ela vai passar! E se abram alas para ela passar... Num tempo em que as mulheres não podiam ter sua autoria publicada, a guerreira fez valer seus direitos, as alas se abriram e ela venceu, ela passou, ela chegou, ganhou a lira e a Rosa de Ouro. Chiquinha Gonzaga, que misturou sua arte com seus amores, fez seu ritmo ser chamego nas Marchinhas para o Povo Brasileiro.

Salve Oxalá, Oxum, Ogum, Iemanjá! Viva a capoeira, o paranauê! Cultura umbanda e candomblé, terreiro dançante! E eis a origem do samba, da festa de negros e mulatos nos morros do Rio de Janeiro, que continua lindo! Que continua sendo o Corcovado, Copacabana, o Arpoador, o Pão de Açúcar, o embalador da MPB. Tem cor, tem beleza, tem gingado, tem morena, tem música, tem cultura, tem visão... Olha a cuíca de novo, povo brasileiro de musicalidade! Deixam suas obras nos pés do samba Mestre Donga e Pixinguinha.

Um ritmo cheio de gingado, romantismo, malandragem: A MPB é nordestina e carioca, mineira e paulista, bahiana, misturada qual café com leite, e pão com doce de leite. A MPB é do Brasil, tem jeitinho, tem azeite, tem dendê, tem coco ralado, paçoquinha, é gostosa de morrer! Decifrável, misturável, cheia de graça, a coisa mais linda, de doce balanço nos ouvidos do mundo. Bossinha nova, nova bossa que Tom, Vinícius, de tantos Morais, na moralidade brasileira popular musical nos deixaram. Sem moralismo: encantadora, cheia de moral no mundo!

Brasil, que o cabelo não nega, é mulato! E o que é que as Bahianas têm? E o que é as Amazonenses têm? E o que é as cariocas têm? Tem bananas, abacaxis, tem melancia, tem maçã, tem mexerica, tem laranja, na cabeça, na cintura, na boca vermelha da bela Carmem Miranda, Musa Popular do Brasil. Tem voz, tem canto, tem molejo, tem asa para voar. Tem o mundo de olho no Brasil, de olho na Carmem, de olho na MPB. O que é que a gente tem?
Tem tudo: falta nada não: tem pra exportar: Ary Barroso, Lamartine Babo, Dorival Caymmi, Lupicínio Rodrigues, Noel Rosa, Mário Reis e Francisco Alves, Luis Gonzaga, o rei do Baião, Jackson do Pandeiro, Dolores Duran, Antônio Maria, Marlene, Emilinha Borba, Dalva de Oliveira, Angela Maria e Caubi Peixoto, Elizeth Cardoso, Tom Jobim e João Gilberto, Milton Nascimento, Elis Regina, Chico Buarque de Holanda, Caetano Veloso e Edu Lobo, Roberto Carlos e Erasmo Carlos, Wanderléa, Silvinha Araújo e mais mil e tantos talentos da MPB, música popular brasileira.

É artista do Brasil do Oiapoque ao Xuí, na doce voz açucarada de Gal Costa, na rouquidão enluarada de Maria Bethânia. Quantas vezes naveguei nos oceanos de Djavan, assim que o dia amanheceu e dava para ver o tempo ruir, ruir de artistas nascendo, de artistas crescendo, de gente musicando a população do Brasil. Com mineirice a luminosa Clara Nunes, coberta de diamantes e ouro, brilhando no Brasil. De volta pro aconchego da sonoridade musicada por Elba Ramalho conhecemos um pouco mais o nordeste, um furacão artístico nacional: Opa! Que isso aqui está bom demais e quem está fora quer é entrar, sabia?

E com tudo isso nós temos escolha, temos alternativa, temos sociedade, contidas e vivenciadas na palavra de Raul, predestinado por ele mesmo, na coceira do rock na garganta, com “tia” Rita Lee, que só quer trazer alegria para todos nós. Porque o Brasil não é só bunda não, tem barriguinha, tem umbigo, tem guerreiras e vencedoras e vencedores, na MPB.
E, no entanto, eles são algo assim, únicos, grandes, dentro do cenário musical brasileiro: Tim Maia e Jorge Ben, hoje Jor. Bem melhor! E o Seu Jorge, vai longe, fazendo biquinho com jeito brasileiro, levar esse cenário e encantar o mundo, todo sensual e faceiro!

A MPB nasce todo dia, na temporada das flores, e enche os pulmões de vida, na voz de Leoni, na voz das Abelhas, na voz das ondas, no balanço do mar, no balanço da brisa: ela é Marisa, que “bem que se quis, como todos nós, depois de tudo ainda ser feliz”.

Hoje, envelhecemos na cidade, fazendo parte da geração coca-cola, de um país que precisa de comida, que não pode ser pasto, de um país que precisa de bebida, que tem fome de diversão, de arte, de balé, que se morde de ciúmes do rock nacional, mas que com seu olhar quarenta e três não deixa para ninguém. O Brasil que quer viver a vida como a vida quer. Fazemos parte de um país de Titãs, de necessidade, vontade, desejo... Fazemos parte de um país de Ira, de Engenheiros, e mesmo num ra-ta-ta-ta de batalhas na dita dura das palavras explodiram em pólvora colorida a música, a população, a brasilidade. A liberdade é a ação da arte, a liberdade não tem idade, a MPB já nasceu eterna e terna. A MPB é leoa, é sertaneja, é country. Não tem codinome: é beija-flor. A MPB é pensadora, é criadora, é criativa, é produto, faz produzir, é cultura, é junção de almas, é eclosão cultural, é força, é coragem de fazer, de ser, de mostrar, a MPB é nossa.

Nós somos a MPB: “viver e não te querer é improvável, é impossível, é insuportável, é proibido”. E são inúmeros os artistas que, mesmo não citados aqui, fazem parte dessa produção que é patrimônio do mundo, e todo o mundo tem seu jeito de “Caetanear”. A MPB é raiz no coração de cada brasileiro.

Hoje somos Anas, Marias, Josefinas, Carolinas, Catarinas, Josés, nesta maravilha de cenário, que todos nós, artistas, escolhemos para nossos carnavais, usamos asfalto como passarela e aquarela, pintamos nossa vida, bordamos nossos amores, alegramo-nos, é só começar um batuque.

E mais, eu sou MPB: eu sou Mulher, sou Povo e sou Brasileira.

Todos os direitos reservados ao autor. Autorizada cópia, desde que divulgada/preservada a autoria.

Mãos

Karina Campos

Nas extremidades dos membros superiores,
se sobrepões amenas, singelas e habilidosas,
leves mãos que afagam, acolhem, tranqüilizam
num simples toque, gesto de mover.
Folheam manuscritos, papéis de carta, enxugam lágrimas
e tocam os lábios num gesto saudosista a reviver em
doces lembranças os lugares por onde ousaram passear.
Ágeis, volúveis, transbordam-se em devaneio tal qual deusas;
donas do poder, da arte de brincar com determinação e manusear o mundo.
Capazes de sentir e se fazer sentir em gestos nobres
através do dedilhar constante produzido por tendões;
sem se esquecer que fazem guerra
essas mesmas que emanam amor e paz.

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Lago do Silêncio


Karina Campos

Eu, cercado de mim mesmo, negro lago.
Profundo. Límpido, intacto, virgem, solene.
Sereno, calado, mudo.

Uma fonte que jorra vida,
uma nascente de amor.
Caminhares verdejantes acompanham o leito
em silêncio.

Os sons da natureza vibram na imensidão da vida.
Um lugar secreto, onde se ouve o bater do coração,
ouve-se o cantar de mil pássaros,
até mesmo o nascer das flores e
o cair das folhas.

Borboletas, leveza de seres, pousam
na relva macia daquela montanha.
Beija-flores fazem sintonia com o belo
entardecer.

O curso do lago segue,
sons nascem naturalmente.
A força e a coragem da água
se mostram vagarosamente.

Deixe-se levar.
O encantamento faz voar.
Onde o grito do lago se manifesta:
É um som de Cachoeira a eclodir no Universo!

O lago guardava este segredo!

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The Voice of Silence

Foto: Gabriel Pessoa, "Chinelos Apaixonados"

Campos, Karina Araújo – Jan 1st, 2008 – Belo Horizonte City/Brazil
Tradução: Cristiane Bahia

In the silence of I myself
It sprouts: the voice of my soul.
I, surrounded of me, as a lake.
Deep, limpid, intact, solemn.
Serene, quiet, silent.

In the external silence, it screams inside me: the voice.
The same which is born of babbling,
Small sounds emanated from the desire,
From the wish of making themselves heard as sound.
Voiced.

Whisper in the ears,
In the time, in the wind,
They make themselves eternal in the air.

The voices are words, sounds,
The voices are the words of the soul,
Are the sounds of the nature.

Are tender, experienced,
Whispered: in the ears, in the navel,
In the mother’s belly,
That speaks the voice of maternity,
Where its silence is heard in the silence of the son.
The moviment of the son becomes voice by the mother.

Voices printed in the times,
“Ouches” that notify existences,
Marks that enlarge the heart.
Screams of pain and love
To the return of the Universe.

To echoe aerial, implicit
In ethereal bodies.
To flit in the infinite:
Wailings of life
Overflowing feelings
That flow printed
In the soul of all of us.

But that in the silence are heard
In the immensity of the beings;
As in the silence of a kiss,
That is marked in the eternity.
As the voice that the glance says through its silence!

Todos os direitos reservados ao autor. Não autorizada cópia. Indique a leitura através deste site http://www.fotoletraspoeticas.blogspot.com/

A Voz do Silêncio

Karina Araújo Campos
Belo Horizonte – 01 de Janeiro de 2008.

No silêncio de mim mesma
ela brota: a voz da minh’alma.
Eu, cercada de mim, como um lago.
Profundo, límpido, intacto, solene.
Sereno, calado, mudo.

No silêncio externo, ela grita dentro de mim: a voz.
A mesma que nasce do balbuciar,
pequenos sons emanados do desejo,
da vontade de se fazerem ouvidas como som.
Sonorização.

Sussurram nos ouvidos,
no tempo, no vento,
eternizam-se no ar.

As vozes são palavras, sons.
As vozes são as palavras da alma.
São os sons da natureza.

São ternas, calejadas,
sussurradas: nos ouvidos, no umbigo,
na barriga da mãe,
que fala a voz da maternidade,
onde seu silêncio é ouvido no silêncio do filho.
O movimento do filho faz-se voz pela mãe.

Vozes estampadas nos tempos,
“ais” que notificam existências,
marcas que engrandecem o coração.
Gritos de dor e amor
ao regresso do Universo.

A ecoar aéreas, implícitas
em corpos etéreos.
A volitar no infinito:
gemidos da vida
transbordando sentimentos
que fluem estampados
na alma de todos nós.

Mas, que no silêncio são ouvidas
na imensidão dos seres;
como no silêncio de um beijo,
que fica marcado na eternidade.
como a voz que o olhar diz através do seu silêncio!

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Girassóis


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